Margaret Marcus, Ex-Judia, EUA (parte 1 de 5)

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Descrição: Margaret discute sua infância na escola dominical, a saída e sarcasmo em relação a todas as religiões organizadas e uma aula sobre Judaísmo e Islã na universidade.

  • Por Margaret Marcus
  • Publicado em 19 Nov 2012
  • Última modificação em 19 Nov 2012
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P: Poderia nos contar como começou seu interesse no Islã?

R: Era Margaret (Peggy) Marcus.  Quando pequena possuía um grande interesse em música, particularmente óperas e sinfonias clássicas consideradas alto nível de cultura no ocidente.  A música era minha disciplina favorita na escola, na qual sempre tirava as notas mais altas.  Por puro acaso ouvi música árabe no rádio que me agradou muito e estava determinada a ouvir mais.  Não deixei meus pais em paz até que meu pai finalmente me levou à seção síria na cidade de Nova Iorque, onde comprei uma pilha de músicas árabes.  Meus pais, parentes e vizinhos achavam o árabe e sua música terrivelmente estranhos e tão desagradável aos seus ouvidos que quando colocava meus discos eles exigiam que eu fechasse todas as portas e janelas de meu quarto, para que não fossem perturbados! Depois que abracei o Islã em 1961, costumava sentar encantada na mesquita em Nova Iorque, ouvindo gravações de Tilawat [recitação corânica] ... pelo celebrado qari (recitador) egípcio Abdul Basit.  Mas em Salat Juma (oração de sexta-feira) o imame não tocava as gravações.  Tivemos um convidado especial aquele dia.  Um jovem negro, baixo, muito magro e mal vestido, que se apresentou como um estudante de Zanzibar, recitou a surata ar-Rahman [um capítulo do Alcorão].  Nunca ouvi um Tilawat tão glorioso, nem mesmo de Abdul Basit!Possuía uma voz de ouro; certamente... Bilal [um companheiro do profeta, que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele, que ficou encarregado de anunciar a chamada para a oração 5 vezes ao dia] devia soar como ele!

Tracei o início de meu interesse no Islã à idade de dez anos.  Frequentava uma escola dominical reformada judaica e fiquei fascinada com a relação histórica entre judeus e árabes.  A partir de meus livros didáticos judaicos, aprendi que Abraão era o pai dos árabes e também dos judeus.  Li como séculos depois quando, na Europa medieval, a perseguição cristã fez suas vidas intoleráveis, os judeus foram bem recebidos na Espanha muçulmana e que a magnanimidade dessa mesma civilização árabe-islâmica estimulou a cultura hebraica a alcançar seu ápice de realizações.

Desconhecendo totalmente a verdadeira natureza do sionismo, ingenuamente pensei que os judeus estivessem retornando para a Palestina para fortalecer os laços próximos de parentesco na religião e cultura com seus primos semitas.  Juntos, acreditava que judeus e árabes cooperariam para alcançarem outra Idade Dourada de cultura no Oriente Médio.

Apesar de meu fascínio com o estudo da história judaica, estava extremamente infeliz na escola dominical.  Naquela época me identificava muito com o povo judeu na Europa, sofrendo um destino horrível sob os nazistas e estava chocada por nenhum dos meus colegas de turma ou meus pais levarem sua religião a sério.  Durante os serviços na sinagoga, as crianças costumavam ler revistas em quadrinhos escondidas em seus livros de oração, rindo e debochando dos rituais.   As crianças eram tão barulhentas e desordeiras que os professores não conseguiam discipliná-las e achavam muito difícil dar as aulas.

Em casa a atmosfera para observância religiosa dificilmente era mais favorável.   Minha irmã mais velha detestava tanto a escola dominical que minha mãe tinha que literalmente arrastá-la para fora da cama de manhã e isso sempre vinha acompanhado de lágrimas e discussões.  Finalmente, meus pais ficaram exaustos e a deixaram deixar de frequentar.  Nos dias sagrados judaicos, ao invés de frequentar a sinagoga e jejuar no Yom Kippur, minha irmã e eu éramos tiradas da escola para participar de piqueniques e festas familiares em restaurantes elegantes.   Quando minha irmã e eu convencemos nossos pais do quanto estávamos insatisfeitas na escola dominical, eles se associaram a uma organização humanista agnóstica conhecida como Movimento da Cultura Ética.

O Movimento da Cultura Ética foi fundado no final do século 19 por Felix Alder.  Enquanto estudava para o rabinato, Felix Alder convenceu-se que a devoção a valores éticos como relativa e feita pelo homem constituía a única religião adequada para o mundo moderno, considerando qualquer relação com o sobrenatural ou teologia irrelevantes.  Frequentei a escola dominical da Cultura Ética toda semana dos onze anos até minha graduação, aos quinze.  Passei a concordar inteiramente com as ideias do movimento e via todas as religiões organizadas e tradicionais com desprezo.

Quando estava com dezoito anos tornei-me membro do movimento jovem sionista local, conhecido como Mizrachi Hatzair.  Mas quando descobri qual era a natureza do sionismo, que tornou a hostilidade entre judeus e árabes irreconciliável, saí desgostosa vários meses depois.  Quando estava com vinte anos e estudava na Universidade de Nova Iorque, um dos meus cursos eletivos era intitulado Judaísmo no Islã.  Meu professor, o rabino Abraham Isaac Katsh, chefe do departamento de estudos hebraicos, não poupou esforços para convencer seus alunos – todos judeus, muitos dos quais aspiravam tornarem-se rabinos – que o Islã derivava do Judaísmo.  Nosso livro didático, escrito por ele, pegava cada versículo do Alcorão, traçando-o diligentemente a sua suposta fonte judaica.  Embora seu verdadeiro objetivo fosse provar aos seus alunos a superioridade do Judaísmo em relação ao Islã, ele me convenceu diametricamente do oposto.

Logo descobri que o sionismo era meramente uma combinação dos aspectos racistas e tribais do Judaísmo.  O sionismo nacionalista secular moderno foi ainda mais desacreditado aos meus olhos quando aprendi que poucos, se é que houve algum, dos líderes do sionismo eram judeus praticantes e que talvez em nenhum outro lugar o Judaísmo tradicional ortodoxo fosse visto com tanto desprezo quanto em Israel.   Quando descobri que quase todos os importantes líderes judaicos na América que apoiavam o sionismo não sentiam a menor dor de consciência pela terrível injustiça infligida sobre os palestinos, não pude mais me considerar judia em meu coração.

Uma manhã em novembro de 1954 o professor Katsh, durante sua aula, argumentou com lógica irrefutável que o monoteísmo ensinado por Moisés (que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele) e as Leis Divinas reveladas a ele eram indispensáveis como base para todos os valores éticos mais elevados.  Se a moral fosse puramente feita pelo homem, como a Cultura Ética e outras filosofias agnósticas e ateias ensinavam, poderia ser mudada facilmente de acordo como capricho, conveniência ou circunstância.  O resultado seria o caos, levando à ruína individual e coletiva.  A crença na outra vida, como os rabinos e o Talmude ensinavam, argumentou o professor Katsh, não era apenas um desejo, mas uma necessidade moral.  Somente aqueles, disse ele, que acreditavam firmemente que cada um de nós será convocado por Deus no Dia do Juízo para apresentar um relato completo de nossa vida na terra e recompensado ou punido de acordo, possuirá a autodisciplina para sacrificar o prazer transitório e suportar dificuldades e sacrifícios para alcançar o bem supremo.

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