Reflexões filosóficas (parte 3 de 5)
Descrição: Essa série de artigos fornece uma estrutura conceitual para responder às “grandes questões” relacionadas a nossa existência. Parte 3 continua com a discussão sobre se nossa existência tem um propósito.
- Por Hamza Andreas Tzortzis
- Publicado em 11 Jul 2016
- Última modificação em 11 Jul 2016
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Acreditar que não temos propósito não é só irracional, é problemático em termos práticos, porque apresenta uma indicação de que muitas das coisas que alcançamos como seres humanos muito provavelmente não teriam acontecido, já que muitas das pessoas que realizaram conquistas surpreendentes, inclusive a descoberta da penicilina, não teriam tido a motivação para alcançar o que alcançaram. Isso porque essas muitas pessoas tinham uma abordagem à vida motivada por um propósito, sem o qual seriam como animais obedecendo nossos instintos. Em outras palavras, robôs químicos vagando à espera da bateria secar! As realidades de uma existência sem propósito também foram destacadas pelo filósofo Arthur Schopenhauer que afirmou que o mundo está falido e não há razão para alegrar-se por sua existência. Ele até argumentou que seria melhor se não existisse e questionou se o suicídio era uma solução plausível.
Por que isso é irracional? Bem, é irracional porque se tudo complexo e projetado que descobrimos parece ter um propósito, incluindo a mariposa insignificante e também as coisas que desenvolvemos e criamos, então logicamente temos um propósito também. Negar isso seria equivalente a acreditar em coisas sem qualquer evidência, já que não há evidência para dizer que não temos propósito. Ao contrário, temos evidência para dizer que as coisas têm um propósito e podemos inferir o mesmo sobre nós mesmos também. Até os cientistas indicam que é irracional afirmar que nosso universo é impessoal e produto de acaso. É interessante que explicaram que os processos físicos no universo têm algum tipo de propósito. Por exemplo, o astrônomo Sir Fred Hoyle descreveu o universo com os atributos de Deus e os físicos Zeldovich e Novikov perguntaram por que a natureza escolheu criar esse universo, ao invés de outro?
Finalmente, podemos argumentar que sem um propósito não temos um significado mais profundo para nossa vida. Por exemplo, se adotarmos a conclusão lógica de uma visão científica apática sobre nossa existência, estamos em um barco naufragando. Esse barco é chamado o universo porque, de acordo com cientistas, o universo sofrerá uma morte quente e um dia o sol destruirá a terra. Portanto, esse barco afundará. Pergunto a você: qual o objetivo de remodelar as cadeiras do deck ou dar um copo de leite para a idosa? Como Fyodor Dostoyevsky, o escrito e ensaísta russo disse: "Sem algum objetivo e algum esforço para alcançá-lo, ninguém consegue viver."
Várias disputas podem se seguir a partir dessa discussão. Primeiramente, uma visão de mundo sem propósito nos dá mais liberdade para criar propósito para nós mesmos. Para explicar ainda mais, alguns existencialistas têm argumentado que nossa vida é, de fato, baseada em nada e desse nada podemos criar um novo campo de possibilidade para nossas vidas e, portanto, criar propósito para nós mesmos. Essa filosofia se apoia na ideia de que tudo é sem sentido e devemos criar uma nova linguagem para nós mesmos, de modo a levar vidas gratificantes. A falha nessa abordagem é que usa significado para afirmar ausência de significado. Também representa uma auto ilusão, já que negam propósito, mas criam um para si mesmos. Adicionalmente implica em não haver verdades e valores morais objetivos, porque está ausente uma base ontológica. Isso é contra intuitivo e se opõe ao nosso consenso intercultural de nosso pensamento moral. A filosofia de guerra é um bom exemplo para mostrar esse tipo de consenso moral. Por 2.500 anos houve um acordo intercultural que não se deve usar venenos na guerra, mesmo que se esteja sendo derrotado. Embora na prática as pessoas nem sempre cumpram, de fato concordaram com essa norma.
Outra disputa inclui a posição do evolucionista de que nosso propósito é propagar nosso DNA, como a afirmação de Richard Dawkins em sua publicação "O Gene Egoísta", de que nossos corpos foram desenvolvidos para fazer exatamente isso. O problema com essa análise é que relega nossa existência a um acidente aleatório por meio de um prolongado processo biológico. Em essência, o valor de nossa vida perde seu significado e a moralidade é relegada ao gosto do indivíduo, como afirma Michael Ruse, um filósofo de ciência:
"A moralidade é uma adaptação biológica como as mãos, os pés e os dentes... A moralidade é apenas um auxiliar para a sobrevivência e a reprodução e qualquer significado mais profundo é ilusório."
A perspectiva evolucionária cria mais problemas do que soluções, já que não consegue fornecer uma explicação adequada para a consciência e a presença de nossas faculdades racionais. Adotando a consciência como exemplo, como uma realidade imaterial subjetiva pode vir de uma substância material? A consciência não é uma coisa física; não está contida em qualquer célula ou estrutura biológica. A realidade mais intuitiva e inquestionável é que somos todos conscientes, mas não conseguimos descrever ou explicar o que é essa consciência. Uma coisa da qual podemos estar certos é que essa consciência não pode ser explicada biológica ou quimicamente e a principal razão para isso é que a evolução não descobre a consciência. É justamente o contrário. Porque a evolução tentar e explicar a verdade da consciência seria equivalente a debater em um círculo! Até os cientistas reconhecem isso. O físico Gerald Schroeder destaca que não há diferença real entre um monte de areia e o cérebro de um Einstein. Para os que advogam uma explicação física para a consciência, seriam necessárias respostas para perguntas mais complexas: "como certos pedaços de matéria repentinamente criam uma nova realidade que não tem semelhança com a matéria?"
Então, se a consciência não pode ser explicada fisicamente, a próxima pergunta deve ser: "como veio a existir?" A história do universo indica que a consciência surgiu espontaneamente e a linguagem emergiu sem qualquer precursor evolucionário. Até os neo-ateus fracassaram em chegar a um acordo sobre a natureza da consciência ou sua fonte, porque não há explicação física coerente o suficiente para convencer. Até o neo-ateu Richard Dawkins admite a derrota em relação à consciência e afirma: "Não sabemos. Não a compreendemos."
Em conclusão, existem mais razões para acreditar que temos um propósito mais profundo, ao invés das outras opções de ausência de propósito e propagação fria e sem valor de nosso DNA. Perceber que temos um propósito é a melhor explicação por meio de inferências que fazemos em relação ao universo e as coisas que nos rodeiam. Atribui-se ao filósofo escocês David Hume a frase: "Um homem sábio correlaciona sua crença à evidência". Assim, nesse caso, seria mais sábio concluir que seres humanos devem ter um propósito e não esqueçamos que isso nos nutre com uma explicação mais significativa para nossa existência. Entretanto, naturalmente surge a pergunta: qual é nosso propósito?
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