N.K, Ex-Católico, EUA (parte 1 de 5)

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Descrição: Um católico que rejeita a fé e adota a Filosofia e posteriormente aceita o Islã, devido a muitas perguntas não-respondidas. Parte 1: Dúvidas na fé.

  • Por N.K.
  • Publicado em 13 Jul 2009
  • Última modificação em 13 Jul 2009
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Nascido em 1954 no interior do noroeste dos Estados Unidos, fui criado em uma família religiosa como católico romano.  A Igreja proveu um mundo espiritual que era inquestionável em minha infância, e mais real do que o mundo físico ao meu redor, mas à medida que cresci e especialmente depois de entrar para a universidade católica e ler mais, minha relação com a religião se tornou cada vez mais questionável, na crença e na prática.

Uma razão foram as mudanças frequentes na liturgia e rituais católicos ocorridos no Concílio Vaticano II de 1963, que sugeriu aos leigos que a Igreja não tinha padrões firmes.  O clero falava sobre flexibilidade e relevância litúrgica, mas para os católicos comuns, eles pareciam estar tateando no escuro.  Deus não muda a revelação, nem as necessidades da alma humana, e não havia nenhuma nova revelação dos céus.  Ainda assim nos apegávamos a essas mudanças, semana após semana, ano após ano, adicionando, subtraindo, mudando a língua de latim para inglês e, finalmente, introduzindo guitarras e música folclórica.  Os padres explicavam e explicavam enquanto os leigos balançavam as cabeças.  A busca por relevância deixou grandes números convencidos de que não havia muita em primeiro lugar.

Uma segunda razão foi um número de dificuldades doutrinárias, como a doutrina da Trindade, que ninguém na história do mundo, padre ou leigo, foi capaz de explicar de forma convincente, e que se resolve por si mesma, para a mente comum pelo menos, como um tipo de divindade-por-comitê, compartilhada entre Deus o Pai, que governava o mundo dos céus; Seu filho Jesus Cristo, que salvou a humanidade na terra; e o Espírito Santo, que era retratado como uma pomba branca e parecia ter um papel consideravelmente menor.  Lembro de querer fazer amizade especial com pelo menos um deles para que pudesse melhorar minha situação com os outros, e com essa finalidade, às vezes orava determinadamente para um e às vezes para o outro; mas os outros dois estavam sempre teimosamente lá.  Finalmente decidi que Deus o Pai devia estar encarregado dos outros dois, e isso colocou um obstáculo formidável no caminho do meu catolicismo, a divindade de Cristo.  Além disso, a reflexão deixou claro que a natureza do homem contradizia a natureza de Deus em todos os detalhes, o limitado e o finito de um lado, o absoluto e o infinito de outro.  Que Jesus fosse Deus era algo que não podia me lembrar de ter realmente acreditado, na infância ou mais tarde.

Outro ponto de incredulidade foi a negociação da Igreja em ações e bônus no paraíso chamada de indulgências, o “faça isso e aquilo e muitos anos serão diminuídos de sua sentença no purgatório” que parecia tão falso a Martim Lutero no surgimento da Reforma.

Também me lembro de um desejo por uma escritura sagrada, um livro que pudesse prover orientação.  Uma Bíblia foi dada a mim em um Natal, uma bela edição, mas ao tentar lê-la, a descobri tão desconexa e destituída uma linha coerente que foi difícil pensar numa forma de basear a vida nela.   Somente mais tarde aprendi como os cristãos resolvem a dificuldade na prática, os protestantes criando teologias sectárias, cada qual enfatizando os textos de sua seita e minimizando o resto; os católicos minimizando tudo, exceto os fragmentos mencionados em sua liturgia.  Algo parecia faltar em um livro sagrado que não podia ser lido como um todo.

Além disso, quando fui para a universidade, descobri que a autenticidade do livro, especialmente o Novo Testamento, tinha ficado sob dúvida considerável como resultado dos estudos hermenêuticos modernos feitos pelos próprios cristãos.  Em um curso sobre teologia contemporânea, li a tradução de Norman Perrin do The Problem of the Historical Jesus (O Problema do Jesus Histórico, em tradução livre) de Joachim Jeremias, um dos principais estudiosos do Novo Testamento desse século.   Um crítico textual que era um mestre das línguas originais e tinha passado muitos anos com os textos, ele finalmente concordou com o teólogo alemão Rudolph Bultmann, que sem uma dúvida, disse que o sonho de escrever uma biografia de Jesus acabou, significando que a vida de Cristo como ele de fato a viveu não podia ser reconstruída a partir do Novo Testamento com qualquer nível de confiança.  Se isso é aceito de um amigo do Cristianismo e um dos seus mais destacados especialistas textuais, pensei, o que sobrava para ser dito pelos inimigos?  E o que restou da Bíblia exceto reconhecer que era um registro de verdades misturadas com ficções, conjecturas projetadas sobre Cristo por seguidores posteriores, eles próprios em desacordo entre si sobre quem o mestre tinha sido e o que ele ensinou?  E se teólogos como Jeremias podiam se ressegurar de que em algum lugar sob as camadas de adições posteriores ao Novo Testamento havia algo chamado o Jesus histórico e sua mensagem, como as pessoas comuns esperavam encontrá-la, ou conhecê-la, se fosse encontrada?

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N.K, Ex-Católico, EUA (parte 2 de 5)

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Descrição: Um católico que rejeita a fé e adota a Filosofia e posteriormente aceita o Islã, devido a muitas perguntas não-respondidas.  Parte 2: O estudo da Filosofia e a leitura do Alcorão.

  • Por N.K.
  • Publicado em 20 Jul 2009
  • Última modificação em 22 Sep 2019
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Estudei filosofia na universidade e ela me ensinou a fazer duas coisas com quem quer que reivindique ter a verdade: O que você quer dizer e como você sabe?  Quando fiz essas perguntas às minhas próprias tradições religiosas, não encontrei respostas e percebi que o Cristianismo tinha escorregado de minhas mãos.  Então embarquei em uma busca que talvez não seja estranha a muitos jovens no Ocidente, uma busca por significado em um mundo sem sentido.

Comecei onde tinha perdido minha crença anterior, com os filósofos, ainda querendo acreditar, buscando não a filosofia, mas uma filosofia.

Li os ensaios do maior pessimista, Arthur Schopenhauer, que ensinou sobre o fenômeno das idades da vida, e que dinheiro, fama, força física e inteligência passarão com a passagem dos anos, mas apenas a excelência moral permaneceria.  Aprendi essa lição e lembrei-me dela depois de anos.  Seus ensaios também chamavam a atenção para o fato de que uma pessoa costumava repudiar nos anos posteriores o que abraçava de forma ardente no calor da juventude.  Com um desejo presciente de encontrar o Divino, decidi me imbuir com os argumentos mais convincentes do ateísmo que pude encontrar, porque talvez pudesse encontrar uma forma de sair deles depois.  Então li as traduções de Walter Kaufmann das obras do defensor da imoralidade Friedrich Nietzsche.  O gênio multifacetado dissecou os julgamentos morais e crenças da humanidade com argumentos filológicos e psicológicos brilhantes que terminaram na acusação da linguagem humana em si, e a linguagem da ciência do século 19 em particular, de ser tão inerentemente determinada e mediada por conceitos herdados da linguagem da moralidade que em sua forma presente não podiam jamais ter esperanças de descobrir a realidade.  Colocando de lado o seu valor imunológico contra o ceticismo total, as obras de Nietzsche explicavam porque o Ocidente era pós-cristão, e de forma precisa predizia a selvageria sem precedentes do século 20, derrubando o mito de que a ciência podia funcionar como uma substituição moral para a agora religião morta.

A nível pessoal, suas tiradas contra o Cristianismo, particularmente na Genealogia da Moral, me deram o benefício de destilar as crenças da tradição monoteísta em um pequeno número de formas analisáveis.  Ele separou conceitos não-essenciais (como o espetáculo bizarro do suicídio de uma deidade onipotente na cruz) dos essenciais, que sei, embora sem acreditar neles, compreendia serem apenas três: que Deus existia; que Ele criou o homem no mundo e definiu sua conduta esperada nele; e que Ele julgaria o homem adequadamente na outra vida e o enviaria para a recompensa ou punição eternas.

Foi durante esse período que li uma tradução do Alcorão que relutantemente admirei, entre reservas agnósticas, pela pureza com a qual apresentava esses conceitos fundamentais.  Mesmo falsas, pensei, não podia haver uma expressão mais essencial de religião.  Como trabalho literário, a tradução não era inspirada e era abertamente hostil ao assunto, embora eu soubesse que o original árabe era amplamente reconhecido por sua beleza e eloquência entre os livros religiosos da humanidade.  Senti um desejo de aprender árabe para ler o original.

Em casa, de férias das aulas, estava andando em uma estrada poeirenta entre alguns campos de trigo e aconteceu do sol se pôr.  Por alguma inspiração, percebi que era um momento de adoração, um momento de se prostar para Deus.  Mas não era algo que alguém pudesse apoiar-se em si mesmo para fornecer os detalhes, mas ao contrário, uma fantasia passageira, ou talvez o começo de uma conscientização de que o ateísmo não era uma forma autêntica de ser.

Levei comigo um pouco dessa inquietude quando me transferi para a Universidade de Chicago, onde estudei a epistemologia da teoria ética, como os julgamentos morais são alcançados, lendo e procurando entre os livros dos filósofos por algo que lançasse uma luz sobre a questão da falta de significado, que era ao mesmo tempo uma preocupação pessoal e o centro dos problemas filosóficos de nossa época.

De acordo com alguns, a observação científica podia apenas produzir afirmações de descrição da forma X ser Y, por exemplo. O objeto é vermelho, seu peso é dois quilos, sua altura é dez centímetros, e assim por diante, nos quais o funcional fosse um 'é' verificável cientificamente, enquanto que nos julgamentos morais o elemento funcional era um 'deve’', uma afirmação de descrição que nenhuma observação científica podia medir ou verificar.  Parecia que ‘dever’ era logicamente sem significado, e com isso todo tipo de moralidade, uma posição que me lembrou daquelas descritas por Lucian em seu alerta de que quem quer que veja um filósofo moral vindo pela estrada deve fugir dele como de um cachorro louco.  Para essa pessoa, a conveniência governava, e nada verificava seu comportamento exceto o que era conveniente.

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N.K, Ex-Católico, EUA (parte 3 de 5)

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Descrição: Um católico que rejeita a fé e adota a Filosofia e posteriormente aceita o Islã, devido a muitas perguntas não-respondidas. Parte 3: Reflexões durante pescaria no Alasca.

  • Por N.K.
  • Publicado em 27 Jul 2009
  • Última modificação em 27 Jul 2009
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Como Chicago era uma universidade mais cara, tinha que levantar o dinheiro para os meus custos de educação e encontrei trabalho de verão na Costa Oeste com um barco de pesca no Alasca.  O mar provou ser uma escola em pleno direito, uma para a qual retornei por um período de oito temporadas, pelo dinheiro.  Encontrei muitas pessoas nos barcos e vi um pouco do poder e grandeza do vento, da água, tempestades e chuva, e a pequenez do homem.  Essas coisas se apresentam diante de nós como um imenso livro, mas meus companheiros pescadores e eu pudemos discernir somente as letras que estavam dentro de nosso contexto: pegar quantos peixes fosse possível dentro do tempo especificado para vendê-los aos compradores.  Poucos sabiam ler o livro como um todo.  Às vezes, de repente, as ondas subiam como grandes montes e o capitão segurava o leme com pontas brancas, enquanto nossa proa mergulhava profundamente em um vale de água verde, para descer no momento seguinte e ressurgir em direção ao céu antes de chegar ao topo da próxima crista e descer novamente.

No início de minha carreira como marujo tinha lido a tradução de Hazel Barnes para “O Ser e o Nada” de Jean Paul Sartre, no qual ele argumentava que o fenômeno somente chega à consciência no contexto existencial dos projetos humanos, um tema que evocava os manuscritos de Marx de 1844. A natureza era produzida pelo homem, significando, por exemplo, que quando o místico vê um grupo de árvores, sua consciência hipostatiza um objeto fenomenal inteiramente diferente de um poeta, por exemplo, ou um capitalista.   Para o místico, é uma manifestação; para o poeta, uma floresta; para o capitalista, madeira.  De acordo com essa perspectiva, uma montanha só parece muito alta dentro do contexto do projeto de escalá-la, e assim por diante, de acordo com as relações instrumentais envolvidas em vários interesses humanos.  Mas os grandes eventos naturais do mar que nos cercava pareciam desafiar, com sua teimosia, irredutível factualidade, nossas tentativas incompreensíveis de chegarmos a termos com eles.  Repentinamente estávamos lá, sacudidos pelas forças à nossa volta sem compreendê-las, nos perguntando se sobreviveríamos.  Alguns, era verdade, pediam ajuda a Deus nesses momentos, mas quando retornávamos a salvo para a costa, nos comportávamos como homens que sabiam pouco sobre Ele, como se aqueles momentos tivessem sido um lapso na insanidade, embaraçosos para pensar a respeito nos momentos mais felizes.  Foi uma das lições do mar que, de fato, tais eventos não somente existem, mas talvez até preponderem em nossa vida.  O homem era pequeno e fraco, as forças à sua volta eram grandes e ele não as controlava.

Às vezes um barco afundava e homens morriam.  Lembro de um pescador de outro barco que trabalhava próximo de nós fazendo o mesmo trabalho que eu fazia, empilhar a rede.  Ele sorria atravessando a água enquanto puxava a rede do bloco hidráulico, empilhando-a esmeradamente na popa para deixá-la pronta para o próximo trabalho.  Algumas semanas depois, seu barco virou enquanto pescavam em uma tempestade, e ele foi pego na rede e afundou.  Eu o vi somente mais uma vez, em um sonho, acenando para mim da popa de seu barco.

A monstruosidade das cenas nas quais vivíamos, as tempestades, os rochedos íngremes com metros de altura que surgiam como torres das águas, o frio, a chuva e a fadiga, os ferimentos ocasionais e mortes de trabalhadores – causavam pouca impressão na maioria de nós.  Supostamente os pescadores eram, afinal de contas, durões.  Em um barco, foi dito que a família que trabalhava nele perdia um membro ocasional da tripulação quando navegava no mar no final da temporada, invariavelmente o único não-membro da família, e sua perda os salvava de salários que de outra forma teriam que ser pagos.

O capitão de outro era um homem de vinte e sete anos que entregava milhões de dólares em siris por ano no Mar de Bering.  Quando ouvi falar dele pela primeira vez, estávamos em Kodiak, tinham amarrado seu barco na doca da cidade depois de uma longa viagem de alguns dias.  O capitão estava indisposto no momento em seu beliche no camarote, onde tinha vomitado sangue por ter comido vidro na noite anterior para provar o quanto era durão.

Estava de certa forma em condições melhores quando o vi depois no Mar de Bering no final de um longo inverno da temporada de pesca do siri.  Ele trabalhava em sua casa do leme, cercado por rádios que podiam captar um sinal de qualquer lugar, computadores, sonares, medidores de profundidade, radares.  Seus painéis de luzes e comutadores eram ajustados para varredura de 180 graus das janelas à prova de estilhaçamento que observavam o mar e os homens no convés abaixo, com quem se comunicava através de alto-falante.  Geralmente trabalhavam sem parar, puxando sua engrenagem da água gelada sob as baterias vigilantes de enormes luzes elétricas presas aos mastros que transformavam a noite perpétua dos meses de inverno em dia.  O capitão tinha uma reputação de falar aos gritos, e uma vez fechou sua tripulação no convés na chuva por onze horas porque um deles entrou para tomar uma xícara de café sem permissão.  Poucos ficavam com ele por mais de uma temporada, embora ganhassem quase o dobro por ano do que, digamos, um advogado ou um executivo de publicidade, e em apenas seis meses.  Fortunas eram feitas no Mar de Bering naqueles anos, antes do excesso de pesca eliminar o siri.

No momento, ele estava ancorado, e amigável o suficiente quando fizemos a amarração para ele, e veio a bordo para sentar e conversar com nosso capitão.  Falaram muito, às vezes fitando pensativamente o mar através da porta ou janelas, às vezes olhando um para o outro de forma penetrante quando algo os animava, como o tópico de o que seus rivais pensavam dele.  “Eles se perguntam por que tenho poucos homens”, disse ele.  “Bem, dormi em minha própria casa um noite no ano passado.”

Depois sua tripulação subiu a âncora, enquanto seus olhos observavam com cautela a água das janelas da casa.  Sua vigilância, sua compleição de morsa, suas viagens sem fim atrás de jogo e mercados, me lembraram de outros animais predadores do mar. Essas pessoas, boas em fazer dinheiro mas negligentes em relação a qualquer objetivo ou propósito final, me impressionavam, e cada vez mais comecei a me perguntar se os homens não precisavam de princípios para guiá-los e dizer-lhes porque estavam aqui.  Sem esses princípios, nada parecia nos distinguir de nossa presa exceto por sermos mais perfeitos e tecnologicamente capazes de pilhar por mais tempo e em uma escala maior, e com maior devastação do que os animais que caçávamos.

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N.K, Ex-Católico, EUA (parte 4 de 5)

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Descrição: Um católico que rejeita a fé e adota a Filosofia e posteriormente aceita o Islã, devido a muitas perguntas não-respondidas. Parte 4: Mais perguntas sem respostas na Filosofia e leituras sobre o Islã.

  • Por N.K.
  • Publicado em 03 Aug 2009
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Essas considerações estavam em minha mente no segundo ano que estudei em Chicago, onde me conscientizei através de estudos dos sistemas morais filosóficos de que a filosofia não tinha sido bem sucedida em influenciar a moral das pessoas de forma significativa e prevenir injustiça no passado, e percebi que havia pouca esperança de que faria isso no futuro.  Descobri que comparar sociedades e sistemas culturais humanos em sua sucessão histórica e multiplicidade tinha levado muitos intelectuais ao relativismo moral, uma vez que não podia ser descoberto nenhum valor moral que por seus próprios méritos fosse transculturalmente válido, uma reflexão que leva ao niilismo, a perspectiva que vê civilizações humanas como plantas que crescem da terra, espalhando suas várias sementes e solos, florescendo por um tempo e depois morrendo.

Alguns anunciaram isso como liberação intelectual, entre eles Emile Durkheim em seu “Formas Elementares da Vida Religiosa”, ou Sigmund Freud em seu “Totem e Tabu”, que discutiu a humanidade como se fosse um paciente e diagnosticou suas tradições religiosas como uma forma de neurose coletiva que poderíamos ter a esperança de curar, ao aplicar-lhes um ateísmo científico completo, um tipo de salvação através da ciência pura.

Sobre esse assunto comprei a tradução de Jeremy Shapiro de “Conhecimento e Interesses Humanos” de Jurgen Habermas, que argumentava que não havia tal coisa como ciência pura da qual se podia depender para forjar um aperfeiçoamento contínuo de si mesmo e do mundo.  Chamou isso de cientismo mal entendido, não ciência.  A ciência no mundo real, disse ele, não era livre de valores, quanto menos de interesses.  Os tipos de pesquisa que conseguiam fundos, por exemplo, eram uma função do que sua sociedade considerava significativo, conveniente, lucrativo ou importante.  Habermas tinha sido de uma geração de acadêmicos alemães que, durante as décadas de trinta e quarenta, sabia o que estava acontecendo em seu país, mas insistiam que estavam simplesmente engajados em produção intelectual, que estavam vivendo no ramo da erudição, e não precisavam se preocupar com o que quer que o estado decida fazer com suas pesquisas.  A horrível indagação que foi vinculada aos intelectuais alemães quando as atrocidades nazistas se tornaram públicas depois da guerra fez Habermas pensar profundamente sobre a ideologia de ciência pura.  O que era óbvio era que o otimismo do século dezenove de pensadores como Freud e Durkheim não era mais defensável.

Comecei a reavaliar a vida intelectual ao meu redor.  Como Schopenhauer, sentia que o nível mais elevado de educação devia produzir seres humanos mais elevados.  Mas na universidade, encontrei pessoas do laboratório falando sobre forjar dados de pesquisa para assegurar o financiamento do próximo ano, eruditos que não permitiam que gravassem suas aulas por medo que os rivais no mesmo ramo pudessem avançar com suas pesquisas e conseguir publicação; professores disputando entre si sobre a extensão dos planos de ensino de seus cursos.  As qualidades morais que estava acostumado a associar com a humanidade comum e incorrigível pareciam ser encontradas com a mesma frequência em acadêmicos sofisticados e em pescadores.    Riram-se de pescadores que, depois de conseguirem um carregamento de peixe em uma grande pescaria, andam para lá e para cá na frente dos outros para deixá-los ver o quanto estão carregados, procurando ostensivamente por mais peixe, o que dizer dos Phds que se comportam da mesma forma sobre seus trabalhos e artigos?  Senti que seu conhecimento não os tinha desenvolvido como pessoas, que o segredo do homem mais elevado não reside em sua sofisticação.

Perguntei-me se não tinha me aprofundado na filosofia tanto quanto possível.  Embora ela tivesse ridicularizado meu Cristianismo e fornecido alguns esclarecimentos genuínos, ainda não tinha respondido as grandes questões.  Além disso, sentia que isso estava de certa forma conectado (não sabia se era causa ou efeito) ao fato de nossa tradição intelectual não parecer mais se ver de forma séria.  O que éramos todos nós, filósofos, pescadores, lixeiros ou reis, se não jogadores em um drama que não entendíamos, desempenhando diligentemente nossos papéis até que nossos substitutos fossem enviados e fizéssemos nosso último desempenho?  Mas podia-se genuinamente esperar por mais que isso?  Li “Kojves Introduction to the Reading of Hegel” (Introdução de Kojves à Leitura de Hegel, em tradução livre), no qual ele explicava que para Hegel a filosofia não culminava no sistema, mas no Homem Sábio, alguém capaz de responder a qualquer questão possível sobre implicações éticas das ações humanas.  Isso me fez considerar nossa própria condição no século vinte, que não podia mais responder a uma única questão ética.

Era como se esse domínio sem paralelo desse século das coisas concretas, tivesse de alguma forma nos feito de coisas.  Contrastei isso com o conceito de Hegel do concreto em sua “Fenomenologia da Mente”.  Um exemplo do abstrato, em seus termos, era a realidade física limite do livro que agora tem em suas mãos, enquanto que o concreto era sua interconexão com as realidades maiores que pressupunha, os modos de produção que determinaram o tipo de tinta e papel, os padrões estéticos que ditaram sua cor e design, os sistemas de marketing e distribuição que o levaram ao leitor, as circunstâncias históricas que construíram a alfabetização e gosto dos leitores; os eventos culturais que tinham mediado seu estilo e uso; em resumo, o quadro maior no qual foi articulado e passou a existir.  Para Hegel, o movimento de investigação filosófica sempre leva do abstrato ao concreto, ao mais real.  Ele era, portanto, capaz de dizer que a filosofia necessariamente levava à teologia, cujo objeto era o basicamente real, a Divindade.  Isso me pareceu apontar para uma carência irredutível em nosso século.  Comecei a me perguntar se, ao materializar nossa cultura e nosso passado, não tínhamos de alguma forma nos abstraído de nossa humanidade mais ampla, de nossa verdadeira natureza em relação à realidade mais elevada.

Nesse ponto li várias obras sobre o Islã, entre elas os livros de Seyyed Hossein Nasr, que acreditava que muitos dos problemas do homem ocidental, especialmente aqueles relacionados ao meio ambiente, derivavam de ter deixado a sabedoria divina da religião revelada, que o ensinou seu verdadeiro lugar como uma criatura de Deus no mundo natural e a compreendê-lo e respeitá-lo.  Sem isso, ele queimava e consumia a natureza com estilos tecnológicos de exploração comercial cada vez mais efetivos que arruinaram esse mundo enquanto ficava cada vez mais vazio por dentro, porque ele não sabia por que existia ou com qual objetivo devia agir.

Refleti que podia ser verdade, mas continuava com a pergunta em relação à religião revelada.  Tudo na face da terra, todos os sistemas religiosos e morais, estavam no mesmo plano, a menos que se pudesse obter certeza de que um deles era de uma fonte mais elevada, a garantida da objetividade, da força completa, da lei moral.  De outra forma, a opinião de um homem era tão boa quanto a de outros, e continuávamos em um mar sem diferenciação de interesses individuais conflitantes, no qual nenhuma objeção válida pode ser levantada sobre o forte comer o fraco.

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N.K, Ex-Católico, EUA (parte 5 de 5)

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Descrição: Um católico que rejeita a fé e adota a Filosofia e posteriormente aceita o Islã, devido a muitas perguntas não-respondidas. Parte 5: Uma viagem ao Egito e a aceitação do Islã.

  • Por N.K.
  • Publicado em 10 Aug 2009
  • Última modificação em 10 Aug 2009
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Li outros livros sobre o Islã e encontrei passagens traduzidas por W. Montgomery Watt de “O que Liberta do Erro” do teólogo e místico Ghazali, que, depois de uma crise de meia-idade de questionamentos e dúvidas, percebeu que além da luz da revelação profética não existe luz na face da terra da qual se possa receber iluminação, o mesmo ponto ao qual meus questionamentos filosóficos tinham levado.  Aqui estava, nos termos de Hegel, o Homem Sábio, na pessoa de um mensageiro divinamente inspirado que sozinho tinha a autoridade de responder a questões do bom e do mal.

Também li a tradução de “O Alcorão Interpretado” de A.J. Arberry, e me lembrei de meu desejo inicial de um livro sagrado.  Mesmo em tradução a superioridade da escritura muçulmana sobre a Bíblia era evidente em cada linha, como se a realidade da revelação divina, ouvida vagamente toda a minha vida, tivesse agora se colocado diante de meus olhos.  Seu estilo exaltado, seu poder, sua finalidade inexorável, sua maneira fantástica de antecipar os argumentos do coração ateu e respondê-los; era uma exposição clara de Deus como Deus e homem como homem, a revelação que impõe respeito da Unidade Divina sendo a revelação idêntica de justiça social e econômica entre os homens.

Comecei a aprender árabe em Chicago, e depois de estudar a gramática por um ano com um bom nível de sucesso, decidi pedir uma licença para tentar avançar na língua em um ano de estudo particular no Cairo.  Também me atraía um desejo por novos horizontes, e depois de uma terceira temporada de pescaria, fui para o Oriente Médio.

No Egito encontrei algo que acredito que traga muitos para o Islã, a marca do puro monoteísmo em seus seguidores, que me impressionou de forma mais profunda do que qualquer coisa que tivesse encontrado antes.  Encontrei muitos muçulmanos no Egito, bons e maus, mas todos influenciados pelos ensinamentos de seu Livro em uma extensão que nunca tinha visto em lugar nenhum.  Já se passaram quinze anos desde então, e não posso me lembrar de todos, ou até da maioria deles, mas talvez aqueles que posso lembrar servirão para ilustrar as impressões que deixaram.

Um foi um homem no lado do Nilo próximo aos Jardins Miqyas, onde eu costumava caminhar.  Encontrei-o orando em um pedaço de papelão, com o rosto voltado para a direção da água.  Comecei a passar na frente dele, mas repentinamente me corrigi e andei à sua volta, para não perturbá-lo.  Enquanto observava um pouco antes de seguir meu caminho, olhava para um homem absorto em sua relação com Deus, ignorando minha presença, e mais ainda minhas opiniões sobre ele ou sua religião.  Para a minha mente, havia algo magnificentemente desinteressado sobre isso, ao mesmo tempo estranho para alguém vindo do Ocidente, onde orar em pública era virtualmente a única coisa que continuava obscena.

Outro foi um garoto do segundo grau que me saudou próximo do Khan al-Khalili, e porque eu falava um pouco de árabe e ele um pouco de inglês e queria me falar sobre o Islã, caminhou comigo vários quilômetros da cidade até Giza, me explicando o máximo que podia.  Quando nos separamos, acho que ele fez uma súplica para que me tornasse muçulmano.

Outro foi um amigo iemenita morando no Cairo que me trouxe uma cópia do Alcorão a meu pedido, para me ajudar a aprender árabe.  Eu não tinha uma mesa do lado da cadeira onde costumava me sentar e ler em meu quarto de hotel, e era meu costume empilhar os livros no chão.  Quando coloquei o Alcorão do lado dos outros lá, ele silenciosamente se abaixou e o pegou, por respeito.  Isso me impressionou porque sabia que ele não era religioso, mas ali estava o efeito do Islã sobre ele.

Outra foi uma mulher que encontrei enquanto caminhava do lado de uma bicicleta em uma estrada não-pavimentada do lado oposto do Nilo, em Luxor.  Estava empoeirado e, de certa forma, mal vestido, e ela era uma mulher idosa vestida de preto dos pés a cabeça que estava caminhando e que sem uma palavra ou olhar, colocou uma moeda em minha mão tão repentinamente que em minha surpresa a deixei cair.  Quando a peguei, ela tinha se apressado e afastado.  Como ela pensou que eu fosse pobre, mesmo obviamente não sendo muçulmano, me deu algum dinheiro sem esperar nada, exceto o que havia entre ela e seu Deus.  Esse ato me fez pensar muito sobre o Islã, porque nada parecia tê-la motivado, exceto isso.

Muitas outras coisas se passaram em minha mente durante os meses que fiquei no Egito para aprender árabe.  Encontrei-me pensando que um homem deve ter algum tipo de religião e eu estava mais impressionado pelo efeito do Islã nas vidas dos muçulmanos, certa nobreza de propósito e generosidade da alma, um efeito que eu jamais tinha visto por qualquer outra religião ou mesmo ateísmo sobre seus seguidores.  Os muçulmanos pareciam ter mais do que eu.

O Cristianismo tem seus pontos bons certamente, mas pareciam se misturar com confusões, e me encontrei mais e mais inclinado a olhar para o Islã por sua expressão mais completa e perfeita.  A primeira pergunta que tínhamos memorizado em nosso catecismo tinha sido “Por que você foi criado?” Para ela a resposta correta era “Para conhecer, amar e servir a Deus”.  Quando refleti sobre aqueles ao meu redor, percebi que o Islã parecia prover a forma mais abrangente e compreensível de praticar isso diariamente.

Quanto ao inglório destino político dos muçulmanos hoje, não senti que fosse uma mancha contra o Islã, ou que o relegasse a uma posição inferior em uma ordem natural de ideologias mundiais, mas o vi como uma fase baixa em um ciclo mais amplo da história.  A hegemonia estrangeira sobre as terras muçulmanas tem sido testemunhada na profunda destruição da civilização islâmica no século treze pelas hordas mongóis, que arrasaram cidades e construíram pirâmides de cabeças humanas das estepes da Ásia Central até o coração das terras islâmicas, depois do qual a plenitude do destino trouxe o Império Otomano para elevar a Palavra de Deus e fazê-la uma realidade política vibrante que resistiu por séculos.  Agora, refleti, era simplesmente o tempo dos muçulmanos contemporâneos se empenharem para uma nova cristalização histórica do Islã, algo que pode-se muito bem aspirar compartilhar.

Quando um amigo no Cairo me perguntou um dia por que eu não me tornava muçulmano, descobri que Deus tinha criado dentro de mim um desejo de pertencer a essa religião, que enriquecia seus seguidores, dos corações mais simples aos intelectos mais magistrais.  Não é através de um ato da mente ou vontade que alguém se torna muçulmano, mas através da misericórdia de Deus, e isso, na análise final, foi o que me trouxe ao Islã no Cairo em 1977.

“Porventura, não chegou o momento de os crentes humilharem os seus corações à recordação de Deus e à verdade revelada, para que não sejam como os que antes receberam o Livro? Porém, longo tempo passou, endurecendo-lhes os corações, e a sua maioria é rebelde e transgressora. Sabei que Deus vivifica a terra, depois de ter sido árida. Elucidamos-vos os versículos, para que raciocineis.” (Alcorão 57:16-17)

Pobre Melhor

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