Aaminah Hernandez, ex-cristã, EUA (parte 1 de 2)
Descrição: Reflexões de uma americana. Parte 1.
- Por Aaminah Hernandez
- Publicado em 16 Sep 2013
- Última modificação em 27 Oct 2013
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Tendo crescido nos EUA nos anos 1980, meu conhecimento do Islã era falho e mínimo. Meu pai ensinou a meu irmão e a mim a sermos informados sobre o mundo, interessados em outras culturas e a ler muito. Na época a mídia retratava o Islã com base na revolução iraniana e o conflito na Palestina. As descrições das questões das mulheres eram limitadas às do tipo “Não sem minha filha”. Embora eu nunca tenha visto ou lido o livro, meu entendimento naquela época era que as muçulmanas eram escravas de seus maridos, não havia limite no número de esposas, as esposas apanhavam ou eram até mortas se dessem à luz uma menina e negligenciadas se não tivessem filhos homens rapidamente. A visão de mulheres com vestimentas pretas, que éramos levados a acreditar que eram pesadas e compostas de várias camadas, incluindo véus sobre seus rostos, era aterrorizante para uma menina educada na era de Madona e Cyndi Lauper. Além desses problemas maiores, nos ensinavam na escola que as mulheres do Oriente Médio não tinham permissão para deixar suas casas e viviam em grande pobreza, compartilhando seus quartos com as outras esposas e todas as crianças, vendo seus maridos raramente. Em nossa rara e mínima sobre a história ou cultura do Islã, não se fazia distinção entre a diversidade de culturas no Oriente Médio e o Islã como religião. Não percebia que outros além dos árabes e alguns afro americanos eram muçulmanos e que nem todos os árabes eram muçulmanos.
Como meu pai me disse que a melhor educação que eu poderia ter era a educação que poderia dar a mim mesma através da leitura, tornei-me uma leitora séria. Passava mais tempo na biblioteca do que em qualquer evento social e lia tanto que, quando era necessário me punir, meus pais sabiam que a única forma eficaz era tirar meus livros. AlhamdulAllah, esse amor pelos livros permaneceu comigo e embora nunca esperasse que acontecesse, esse amor pelo aprendizado me guiou para o Islã. Li A autobiografia de Malcom X quando estava no segundo grau e, embora não tivesse aberto minha mente para o Islã, me recusei a comer porco depois disso. Mesmo não tendo causado uma mudança profunda em meu pensamento, nos anos seguintes percebi que plantou algo em meu coração e mente. Eu só não estava pronta para aceitar ou pensar muito a respeito.
Ao longo dos anos fui abusada, molestada e usada por muitas pessoas em minha vida. Isso me levou a sair da casa de meus pais quando estava com 16 anos. Meu irmão permaneceu na casa e lutou com seus próprios problemas, incluindo atividade em gangues. Terminei o segundo grau e prossegui com a minha vida, orgulhosa de poder lidar com tanta responsabilidade sozinha. Não pensava muito em Deus na época. Envolvi-me superficialmente com Wicca (bruxaria branca), mas estava apenas brincando e percebo agora como fui abençoada por não ter causado danos sérios a mim mesma ou a outros com meus jogos. Também comecei a pegar partes de práticas culturais religiosas, como a espiritualidade tradicional celta e dos índios americanos (sou mistura de índios americano e irlandeses) e Hinduísmo e Budismo - sem de fato compreender nada ou me conectar adequadamente com um Poder Maior.
Vivia uma vida bem louca de sexo, uso moderado de drogas, boates e festas. “Amava” a todos e me divertia de todas as formas hedonistas que pudesse, sem preocupação com meu futuro nessa terra ou na Outra Vida. Também sofria de grandes depressões. De fato, as depressões começaram quando era muito jovem, parcialmente em resposta às restrições que meus pais cristãos me impunham. Às vezes era suicida e foi somente pela graça de Allah que minhas tentativas não causaram qualquer dano permanente ao meu corpo ou mente.
Embora professasse uma consciência social e fosse a primeira a apoiar todos os tipos de causas, vivia minha vida de forma muito irresponsável. Não tinha empregos regulares, vivia precariamente e tentava ter poucas preocupações. Embora vivesse com muito pouco, era de fato muito materialista e egocêntrica. Não fazia nada realmente valioso para a sociedade e drenava minha família e amigos.
Foi durante esse período que encontrei um dos companheiros de gangue do meu irmão e fiquei seriamente envolvida. Embora por causa de nosso relacionamento tanto meu irmão quanto o amigo tenham deixado a gangue, muitas tribulações ainda nos esperavam. Meu novo homem tinha um problema sério com drogas com o qual eu não era experiente o suficiente para lidar e não conseguia fazer nada a respeito. Incorremos em todo o tipo de problemas legais e fugimos para outro estado para evitá-los. Durante essa época, atingi um nível muito baixo, vivendo no parque, passando fome, sofrendo abortos e fazendo coisas por dinheiro que nunca pensei que faria.
Quando retornamos para nosso estado meu namorado foi preso e eu descobri que estava grávida novamente. Por algum milagre de Allah meu filho era saudável e forte e consegui levar a gravidez até o fim. Nesse ínterim meu irmão tinha estado preso e se convertido ao Islã, mas ao ser libertado mudou de cidade e não tínhamos contato. Depois que meu filho nasceu meu irmão veio visitar a família. Contou-me muito do que estava aprendendo e fiquei impressionada com as mudanças em sua personalidade e comportamento. Parecia que as restrições do Islã eram uma coisa muito boa para ele. Anteriormente ele tinha sido diagnosticado (acredito eu corretamente) com transtorno esquizoafetivo (esquizofrenia, incluindo alucinações, com depressão profunda), mas desde sua conversão não exibia sintomas e não precisava de tratamento. Meu irmão se tornou um homem gentil e de fala suave, vestido em vestimentas tradicionais e se comportava com grande respeito. Compartilhou o básico do Islã comigo e fiquei feliz por ele que tivesse encontrado essa crença, mas não tinha interesse em mudar minha própria vida.
Aaminah Hernandez, ex-cristã, EUA (parte 2de 2)
Descrição: Reflexões de uma americana. Parte 2
- Por Aaminah Hernandez
- Publicado em 28 Oct 2013
- Última modificação em 28 Oct 2013
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Com o pai do meu filho na prisão, tentei me tornar mais responsável e colocar minha vida em ordem pelo bem do meu filho. Comecei a frequentar a igreja com minha mãe. Poucos meses depois de meu irmão vir para casa em visita, ele retornou com uma esposa totalmente coberta e meses depois ela estava grávida do primeiro filho deles. Queria gostar de minha nova cunhada, mas pensando em retrospectiva estava envergonhada de meu próprio jeito de ser e, por essa razão, não podia aceitar a modéstia dela. Que Allah a abençoe por sua paciência e disposição em continuar a compartilhar o Islã comigo, apesar de minha atitude em relação a ela. Meu irmão também trouxe um amigo para conversar com minha mãe sobre o Islã. Foi a primeira vez que encontrei um muçulmano além de meu irmão e lembro que suas visitas despertaram um lado meu que desconhecia. Esse homem muçulmano me atingiu como uma luz radiante. Sei agora que era porque ele tinha nur (luz, brilho) em seu rosto, embora estivesse muito envergonhada para olhar diretamente para ele. Toda vez que ele visitava, me pegava correndo para cobrir meu corpo vestido pela metade. Até hoje faço dua (súplicas) pela segurança e bem-estar desse irmão por ter causado tamanha impressão em mim, mas nunca mais o vi desde então. Por essa época tinha encontrado um homem que parecia bom e responsável e estava saindo com ele. Meu irmão e sua esposa se mudaram para morar com minha mãe, meu filho e eu, e meu novo noivo visitava todos os dias. Poucos meses antes de meu sobrinho nascer, meu irmão e sua esposa se mudaram para seu próprio apartamento e eu tinha irritado tanto minha pobre cunhada que não podíamos mais manter contato. Então casei com meu noivo e também saí da casa de minha mãe.
Depois do nascimento do meu sobrinho e de meu casamento, comecei a visitar meu irmão e sua esposa. Era tocada pela paz de sua casa e vida familiar. Minha cunhada procurava deixar a mim e a meu filho confortáveis quando visitávamos e começou a falar um pouco mais sobre o Islã. Meu marido não gostava de meu irmão e fez comentários disparatados diretamente para ele e também pelas costas dele que me envergonharam. Isso provocou discórdia em meu casamento e comecei a passar muito tempo na casa de meu irmão, já que meu marido não permitia que eu trabalhasse. Com o tempo me vi interessada na cobertura de minha cunhada e comecei a compreender o conforto que ela devia sentir, mantendo sua privacidade. Também fui capaz de determinar que o tecido usado não era sufocante ou quente como eu esperava. Quando sugeri ao meu marido que eu talvez gostasse de me cobrir, ele zombou de mim. Ele sempre me encorajava a usar roupas reveladoras e acho que ele se sentia bem em ter uma esposa “sexy”, mas eu não me sentia respeitada. Depois de uns poucos meses de casamento e apenas uma semana depois de nosso batismo na igreja, ele me disse que estava tendo um caso extraconjugal e não queria mais continuar casado. Mais uma vez minha vida estava desorganizada e me mudei de volta para a casa de minha mãe, com meu filho.
Claro, passava ainda mais tempo com minha cunhada. Meu irmão e sua esposa eram as únicas pessoas que me deram apoio depois que meu marido me abandonou. A igreja que frequentávamos me disse que havia sempre uma razão para um homem ter um caso e essa razão era um defeito da esposa. Também me disseram que não deveria procurar trabalho ou sair da casa dele, mesmo ele tendo dito para eu sair, porque estava pecando por criar uma vida sem ele, ao invés de ser paciente e aguardar que ele retornasse. A igreja não ofereceu para pagar pelo alimento, roupas ou fraldas do meu filho, para que eu pudesse esperar que “Deus tocasse o coração do meu marido”. Apenas me julgaram e isso me tornou muito cínica. Meu irmão e sua esposa entenderam que eu precisava cuidar de meu filho e que meu casamento tinha terminado. Ofereceram sua casa e minha cunhada ofereceu para cuidar do meu filho para que eu pudesse trabalhar. Dedicaram algum tempo para explicar as visões islâmicas sobre casamento, divórcio e direitos das mulheres. Fiquei muito surpresa em descobrir que essa religião supostamente machista era de fato mais realista e compreensiva em relação à minha situação do que minha igreja tinha sido.
Infelizmente, antes que pudesse dizer a meu irmão que estava pronta para morar com ele, ele e sua família foram forçados a deixar a cidade de forma muito inesperada. Depois que se instalaram, minha cunhada escreveu e começamos a manter contato. Depois de alguns meses, com minha vida ainda em uma completa bagunça, decidi que estava cansada de tentar viver do meu próprio jeito. Encontrei o antigo patrão de meu irmão, que era muçulmano, e implorei que levasse a mim e meu filho para a casa de meu irmão. Ele concordou com alegria e também me deu um Alcorão para ler no caminho. Esse irmão era muito gentil e respeitoso comigo e também muito atencioso com meu filho. Ofereceu para se casar comigo, mas fiquei chocada e pedi tempo para ficar com meu irmão. Ele me levou até meu irmão sem ressentimentos e voltou para seu negócio.
Morar com meu irmão e sua esposa revelou-se um desafio maior do que eu esperava e éramos terrivelmente pobres. Mas fiz minha shahadah (testemunho de fé), vivia em uma cidade onde ouvia o adhan (chamada para oração) cinco vezes ao dia e estava cercada de muçulmanos. Havia muitos problemas também, mas sempre me lembro de como era bonito e sinto falta daqueles dias. Meu irmão e sua esposa me ensinaram como fazer wudu (ablução), orar, pensar sempre em Deus e quase tudo que eu precisava saber para começar a viver como muçulmana.
Por fim, precisava ir para casa para encontrar trabalho e dar uma vida melhor para meu filho. Parei de usar o hijab e o niqab (véu no rosto) e fiz o que tinha que fazer para encontrar trabalho. Tinha tido alguns progressos morais básicos e afirmava orgulhosamente que era muçulmana, mas achava muito difícil viver como uma. Minha cidade não tinha uma comunidade unida e, infelizmente, meu passado antes do Islã tinha vazado e as irmãs não estavam dispostas a falar comigo. AlhamdulAllah, encontrei um emprego no qual tinha acesso à internet e comecei a procurar informação sobre o Islã e a comprar livros. Isso me levou a comprar hijabs e, por fim, niqabs, embora meu patrão se recusasse a permitir que eu usasse hijab. On-line fiz muitas amigas muçulmanas e construí minha própria pequena comunidade. Também encontrei um novo marido. Devido à minha própria impaciência e visões particularmente estritas, esse casamento também fracassou e eu o abandonei. Depois de deixar meu marido, novamente larguei o hijab e o niqab e comecei a viver um pouco descontroladamente. Escondi bem, mas não vivi islamicamente por um tempo. Até hoje me pergunto que direção minha vida tomaria se tivesse ficado com aquele marido, mas aparentemente Allah tinha outros planos para mim.
Novamente, encontrei um homem. Era bondoso e gentil e nos apaixonamos. Mas ele não era muçulmano. Fui honesta com ele, dizendo que era muçulmana e só podia me casar com um muçulmano. Comecei a usar o hijab novamente e ele aceitou. Estava disposto a aceitar o Islã, fez a shahadah e nos casamos. Depois de algum tempo fui novamente abençoada em encontrar um emprego com serviço de internet e construí uma comunidade de irmãs novamente. Finalmente comecei a fazer o que sempre quis: escrever. Com o apoio das irmãs on-line, comecei até a escrever histórias e artigos islâmicos. Meu empregador também apreciava o ponto de vista islâmico que introduzi em nosso trabalho de assistência social e também da integridade que levei para o escritório. Estavam satisfeitos de eu usar hijab e me apoiaram, tanto quanto puderam, como não muçulmanos.
Embora eu continue a me empenhar muito, nem sempre é fácil. Luto como qualquer um e minha fé às vezes parece que pode vacilar. Mas tento lembrar que tudo está nas mãos de Allah e que, desde que eu esteja lutando com minha própria nafs (ego humano) e O obedecendo, Ele me protege. Sou abençoada por ter muitas amigas muçulmanas em todo o mundo e espero, insh’Allah, me mudar para uma comunidade de crentes mais forte. É impossível para mim esquecer que Allah usou meu irmão mais novo para me trazer para a verdade e reconheço que essa bênção é única. Embora meus pais não estejam dispostos a ouvir sobre o Islã, sei que sou abençoada por ter uma família com quem posso compartilhar essa dádiva. Faço dua para que através de meus escritos eu glorifique Allah e encoraje outros a buscar Seu Caminho - o único caminho para a felicidade e uma vida boa - o Islã.
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