Escravidão (parte 1 de 2): Uma Revisão

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Descrição: O artigo discute três questões: (a) escravidão na tradição judaico-cristã (b) escravidão antes da guerra civil nos EUA (c) escravidão moderna.

  • Por Imam Mufti (© 2016 IslamReligion.com)
  • Publicado em 02 May 2016
  • Última modificação em 25 Jun 2019
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Slavery1.jpgPrimeiro, um judeu ou cristão com conhecimento sabe muito bem que a escravidão é discutida na Bíblia.  A lei judaica tem muito a dizer sobre escravos e seu tratamento.  Essa questão não está aberta ao debate.  É fato que todo rabino e pastor treinados estão cientes.

Segundo, assim como os judeus e os cristãos não discutem a escravidão em seus ensinamentos e sermões, os muçulmanos não ensinam muito sobre o assunto.  Por quê? A razão simples é que a escravidão na forma como existia nos tempos antigos não existe mais.  Falar sobre "escravidão no Islã" como se os muçulmanos a praticassem hoje é desonestidade. 

Todos os países têm leis contra a escravidão.  Entretanto, especialistas dizem que a escravidão hoje assumiu uma forma nova, que discutiremos brevemente.

Definição de escravidão da ONU

O escravo tem três características que o definem: sua pessoa é propriedade de outro ser humano, seu desejo é completamente sujeito à autoridade de seu dono e seu trabalho é obtido por coação.[1] A comunidade internacional condenou a escravidão como um das piores violações aos direitos humanos e a definição clássica de escravidão, estabelecida na Convenção sobre a Escravidão de 1926 é: "O status ou condição de uma pessoa sobre a qual qualquer ou todo o poder vinculado ao direito de propriedade é exercido."[2] Em 1956 foram acrescentadas várias definições adicionais de escravidão: servidão por débito, servidão, a prática de casamento forçado, transferência de esposas, herança de esposas e transferência de uma criança com o propósito de exploração.[3]

Raízes da escravidão na Bíblia

A Bíblia, tanto no Velho quanto no Novo Testamento, endossa a escravidão.[4] A Bíblia existia antes do Alcorão.

A Bíblia afirma que uma vez Noé acordou e constatou que um de seus filhos, Cam, tinha lhe visto nu.  Noé amaldiçoou seu filho pelo comportamento inadequado e todos os descendentes de Canaã, o filho de Cam, dizendo: "Escravo de escravos será para os seus irmãos" (Gên. 9:25).  Deve-se destacar que essa história ou algo semelhante não se encontra no Alcorão ou nos ensinamentos do profeta Muhammad, que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele. 

Existe uma longa tradição entre cristãos que Cam é o pai das raças negras da África, Sem é o pai dos semitas (que incluem os árabes e judeus) e Jafé é o pai dos povos brancos.  Portanto, considera-se que essa passagem da Bíblia deu supremacia às raças brancas e fez das raças negras seus servos.[5] Essa "passagem bíblica se tornou a justificativa para a escravidão dos negros por muitos séculos."[6] Não muito tempo atrás, na África do Sul, a Igreja Reformada se referia a essa "maldição" para apoiar o "direito" dos brancos de governar os negros.

A escravidão é mencionada duas vezes nos dez mandamentos encontrados na Bíblia,[7] mas nem uma vez nos dez mandamentos do Alcorão. 

O Levítico 25:44-46 (um dos livros do Torá atual, a escritura judaica) é um texto chave para a justificativa bíblica da escravidão.  Diz que Deus disse aos judeus: "E quanto aos escravos ou às escravas que chegares a possuir, das nações que estiverem ao redor de vós, delas é que os comprareis... E deixá-los-eis por herança aos vossos filhos depois de vós, para os herdarem como possessão."

Abraão, "aquele que Deus escolheu para Seu amor", e "o pai dos crentes", comprou escravos de Arão (Gên. 12:50), armou 318 escravos nascidos em sua própria casa (Gên. 14:14), incluiu-os em sua lista de propriedades (Gên. 12:16, 24:35-36) e os deixou para seu filho Isaque (Gên. 26:13-14).  A Bíblia diz que Deus abençoou Abração pela multiplicação de seus escravos (Gên. 24:35).  Na casa de Abraão os anjos disseram a Agar, sua escrava, para retornar para Sara.  Os anjos disseram a ela: "Volta para a tua senhora e humilha-te diante dela" (Gên. 16:9).

Ao comando de Deus Josué fez escravos (Josué 9:23), assim como Davi (1 Reis 8:2,6) e Salomão (1 Reis 9:20-21).

Jó, a quem a Bíblia chama de "imaculado e íntegro", foi "um grande dono de escravos." Ver Jó 1:15-17, 3:19, 7:2, 31:13, 42:8 onde Jó fala de seus escravos.[8]

Jesus aceitou a escravidão.  Os Evangelhos atuais não têm uma única palavra atribuída a Jesus que diga algo sobre a escravidão.  Jesus se encontrou com escravos (Lucas 7:2-10, 22:50, etc.) e fez as parábolas dos escravos (Mateus 13:24-30, 18:23-35, 22:1-14, Lucas 12:25-40, 14:15-24, etc.), mas nunca falou contra a escravidão.  Compare com o que o profeta árabe do Islã disse sobre escravos no próximo artigo.

Em aproximadamente setenta passagens os discípulos falaram diretamente em apoio a escravidão.  Disseram aos escravos para aceitar seus destinos e instruíram seus donos a tratá-los com bondade (1 Coríntios 7:20-21, Efésios 6:5-9, Col. 3:22-25, 1 Tim 6:1-2, Tit 2:9-10, Filemon 10-18, 1 Pedro 2:18-19).  1 Tim 6:1-3 instrui os escravos a aceitarem sua posição e a obedecerem a seus donos porque é ordenado pelo "Senhor Jesus Cristo."

A maioria dos teólogos e estudiosos cristãos até o final do século passado acreditava que a Bíblia sancionava a escravidão.  A lista inclui Agostinho, Aquino, Lutero, Calvino e outros.[9]

Em 1835 o sínodo presbiteriano de West Virginia atacou o movimento de libertação dos escravos, chamando-o de uma crença contrária "à autoridade mais clara da palavra de Deus."[10]

O Relatório da Assembleia geral (presbiteriana) da Velha Escola de 1845 concluiu que a escravidão era baseada em "algumas das declarações mais claros da Palavra de Deus".[11]

Em 1861um rabino, Dr.  M.J.  Raphall de Nova Iorque, escreveu um panfleto muito divulgado intitulado "The Bible View of Slavery" (A visão bíblica da escravidão) em defesa da escravidão.[12]

Até 1957 John Murray, do Seminário teológico de Westminster[13], ainda argumentava que a Bíblia permite a instituição da escravidão e que os sábios cristãos anteriores estavam corretos em sua compreensão da Bíblia.

Escravidão na constituição dos EUA

O Compromisso dos três-quintos encontra-se no artigo 1, seção 2, parágrafo 3 da Constituição dos EUA.  O Compromisso dos 3/5 permite que mais donos de escravos se tornem legisladores, mesmo que os 3/5 da população de escravos computada não tivesse voz ou voto na democracia.

O Compromisso de comércio de escravos foi um acordo feito durante a Convenção constitucional de 1787 que protegia os interesses dos donos de escravos e impediu o Congresso de agir sobre o comércio de escravos por vinte anos.  O Compromisso de comércio de escravos interrompeu a importação depois de 1807, encorajando a reprodução de escravos dentro dos Estados Unidos e os leilões em todo o sul.

Escravidão depois da guerra civil americana[14]

A Guerra civil americana foi travada, em parte, por causa da escravidão.  Durante a guerra o presidente Abraham Lincoln emitiu a Proclamação de emancipação, que libertou todos os escravos nos estados rebeldes.  A vitória do norte em 1865 acabou com a escravidão legalizada em todos os Estados Unidos.

A escravidão como praticada no velho sul tirou dos negros qualquer controle sobre suas próprias vidas; deviam ser escravos por toda a vida, seus filhos nasciam na escravidão, eram proibidos de receber educação formal, punidos severamente por pequenos atos de desobediência, as famílias eram separadas com os filhos sendo vendidos e as mulheres eram exploradas sexualmente.  O sistema de escravos da América com base na raça foi elaborado para tirar a humanidade do escravo em todos os níveis, com base nas ideias tiradas da domesticação de animais.  A desumanização tinha um significado especial para o sistema escravocrata da América.  Na América os escravos eram marcados pela cor de sua pele.  Nisso o sistema escravocrata da América era apoiado pela religião americana: a Bíblia informou aos cristãos que os escravos não eram humanos totalmente iguais, mas sim descendentes de Canaã, marcados por Deus para serem inferiores e servos dos demais.[15]

Escravidão hoje

A escravidão legalizada pode ter terminado, mas a instituição existe hoje sob nomes diferentes.  Os Direitos Humanos das Nações Unidas afirma: "A escravidão foi a primeira questão de direitos humanos a despertar preocupação mundial e, ainda assim, continua nos dias de hoje."[16]  O Departamento de Estado dos EUA também reconhece a "escravidão moderna."[17]

Os escravos são mais baratos hoje do que jamais foram em aproximadamente 4.000 anos.  Em 1850 um escravo custava em torno de US$ 40.000 em moeda americana de hoje.  Agora um escravo custa de US$ 30 a US$ 90.  Existem 27 milhões de escravos em estimativas conservadoras e mais do que em qualquer período na história humana.[18]

"...entre 14.000 e 17.500 pessoas são traficadas para os Estados Unidos anualmente, de acordo com o governo dos EUA, a maioria é forçada à prostituição, servidão doméstica ou trabalho agrícola.  A qualquer tempo, entre 52.000 e 87.000 estão em servidão... de acordo com as Nações Unidas, e os lucros com o tráfico humano estão entre os três maiores para o crime organizado, depois das drogas e das armas."[19]



Notas de rodapé:

[1] Definição tirada de D.B. Davies, The Problem of Slavery in Western Cultures (Cornell University Press, 1966), 31.

[4] Artigo sobre escravidão no Velho e Novo Testamentos no New Bible Dictionary (2ª edição, Londres: IVP, 1986), 1121-1125.  Deve ser destacado que o New Bible Dictionary  tem uma ênfase evangélica.

[5] Griffith Thomas, Genesis: A Devotional Commentary (Grand Rapids: Eerdmas, reimpressão 1953), 95-99.

[6] David Brion Davis, Inhuman Bondage: The Rise and Fall of Slavery in the New World (Oxford University Press, 2006) 5.

[7] A maioria das pessoas não está ciente de que os Dez Mandamentos bíblicos mencionam a escravidão duas vezes, ver Êxodo 20:17 e Deuteronômio 5:21, exigindo que seja dado aos escravos um dia de descanso e proibindo a cobiça do escravo do vizinho.

[8] J.H.  Hopkins, A Scriptural, Ecclesiastical, and Historical View of Slavery, from the Days of the Patriarch Abraham, to the Nineteenth Century, (New York, 1864), 76.

[9] A.  Ruppercht, ‘Attitudes on Slavery Among the Church Fathers,’ in New Dimensions in New Testament Study (Grand Rapids: Zondervan, 1974), 261-277; J.  Kahl, ‘The Church as Slave-Owner,’ in The Misery of Christianity (Londres: Penguin, 1971).

[10] H.  Shelton Smith, In His Image, But…Racism in Southern Religion, 1719-1910 (North Carolina: Duke University Press, 1971) 172.

[11] J.  Murray, Principles of Conduct (London: IVP, 1957), 260.

[13] (Westminster Theological Seminary), uma escola de graduação cristã presbiteriana reformada localizada na Pensilvânia com uma localização via satélite em Londres.  Ver J.  Murray, Principles of Conduct (London: IVP, 1957).

[14] Siga a linha cronológica para aprender mais sobre a história da escravidão nos EUA.

[15] "North American Slave Narratives" é um projeto da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill que coleta livros e artigos documentando a história coletiva e individual de afroamericanos lutando por liberdade e direitos humanos nos séculos dezoito e dezenove e no início do século vinte. 

Documentos que discutem a escravidão americana podem ser encontrados em American Slavery As It Is: Testimony of a Thousand Witnesses, 1839, de Theodore Weld, republicado em Slavery In America (Illinois: Peacock, 1972) e W.  L.  Rose (ed.), A Documentary History of Slavery in North America (Oxford University Press, 1976).   Para uma discussão autorizada da história da escravidão americana veja Inhuman Bondage: The Rise and Fall of Slavery in the New World de um historiador ganhador do Prêmio Pulitzer, David Brion Davis.

[16] http://www.ohchr.org/EN/Issues/Slavery/SRSlavery/Pages/SRSlaveryIndex.aspx)

[17] http://www.state.gov/j/tip/what/)

[18] www.freetheslaves.net)

[19] "Slavery is not dead, just less recognizable (A escravidão não acabou, só está menos reconhecível)" (http://www.csmonitor.com/2004/0901/p16s01-wogi.html)

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Escravidão (parte 2 de 2): Escravidão na Lei Islâmica com algumas observações históricas

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Descrição: A escravidão é ilegal em todos os países muçulmanos.  O artigo destaca as regras humanas da Sharia para lidar com os escravos quando eles existiam.  São feitas referências às fontes primárias do Islã: o Alcorão e as instruções do profeta Muhammad.  Também, são feitas algumas observações históricas interessantes.

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1. Princípio islâmico: as pessoas nascem livres e a escravidão é temporária.

O Alcorão afirma:

"Nós vos criamos de um homem e de uma mulher, e vos fizemos como nações e tribos, de modo que vos conheçais uns aos outros.  De fato, o mais honrado entre vós aos olhos de Deus é o mais temente." (Alcorão 49:13)

O Profeta do Islã declarou:

"Todos os seres humanos são filhos de Adão e Adão foi criado da terra."[1]

Slavery2.jpgO princípio de que os seres humanos nascem livres e a escravidão é acidental é aceito por todos os sábios do Islã.  Algumas consequências importantes desse princípio são:

·Não é permitida a escravidão voluntária.  Uma pessoa livre não pode se tornar um escravo, mesmo que queira.

·Uma pessoa livre não pode ser escravizada.  O ponto interessante é que os teólogos muçulmanos não decidiram isso, mas sim o profeta do Islã, Muhammad, que a misericórdia e bênçãos de Deus estejam sobre ele, que declarou ser um pecado há 1.400 anos.  Ele disse: "Existem três tipos de pessoas contra as quais testemunharei no Dia do Juízo.  Dessas três, uma é a que escraviza um homem livre, o vende e consome esse dinheiro."[2]

·Uma criança não reclamada, sem pai ou mãe conhecidos, deve ser tratada como pessoa livre, mesmo que pareça ter pais escravos.

2. Um escravo tem direito a respeito e dignidade humana.

A própria palavra "escravo" tem conotações extremamente negativas de tratamento bárbaro.  Compare com a forma como o profeta da Misericórdia falou sobre os escravos há 1.400 anos:

"Seus servos são seus irmãos! Deus os colocou sob seu cuidado. Aquele cujo irmão está sob seu cuidado deve alimentá-lo com o que se alimenta e vesti-lo da mesma forma que se veste. E não os sobrecarreguem além de suas capacidades, mas se os sobrecarregá-los (com uma carga insuportável) ajude-os (compartilhando de seu fardo extra)."[3]

"Quando um servo prepara a sua comida e passa pela dificuldade do calor e da fumaça, você deve fazer com que ele (o servo) se sente e coma junto com você e, se não o fizer, que separe uma parte para o servo."[4]

O profeta da Misericórdia proibiu bater nos escravos.  Declarou que a expiação por bater ou esbofetear um escravo era libertá-lo[5].

Além disso, não se deve tratar o escravo com palavras ofensivas.  O profeta da Misericórdia disse para não chamá-los de "meu escravo ou minha escrava." Disse: "Todos vocês são servos de Deus!" Trate-os como "Ó meu rapaz, ó minha moça!"[6]

Umar ibn al-Khattab, o segundo califa do Islã, era tão apegado a Salim, um escravo liberto, que queria nomeá-lo para ser o califa, se estivesse vivo.  Salim costumava liderar os muçulmanos em oração, o que é considerado uma honra na tradição islâmica.

3. O Islã não iniciou o sistema de escravidão.  Existia no Judaísmo, no Cristianismo e na Índia e na China antes do Islã.

Desde o início o Islã abriu as portas para a libertação de escravos e para, no fim, acabar com a escravidão.  O paradigma islâmico não ignorou as realidades do mundo, nem o endossou.  O Islã o regulou.  Como a estudiosa alemã Annemarie Schimmel destacou: "...portanto, a escravidão é teoricamente condenada a desaparecer, com a expansão do Islã."[7]

A Sharia limitou seriamente os canais por meio dos quais o número de escravos podia se multiplicar.  A única fonte de escravidão era cativos de guerra legítima e as crianças nascidas de pais escravos.  No caso de guerra os cativos não tinham que ser escravizados.  A escritura islâmica estabeleceu outras opções de lidar com eles:

·Libertação incondicional (Alcorão 47:4)

·Resgate (Alcorão 47:4)

Depois de limitar as fontes de novos escravos, a lei islâmica lidou com a realidade dos escravos existentes. 

4.  O Islã garantiu direitos religiosos iguais para os livres e os escravos e também na maioria das questões civis.  As leis especiais eram para facilitar o trabalho deles.

Os escravos eram iguais aos homens livres em termos de obrigações religiosas e também em relação à recompensa e punição de Deus.  O testemunho de um escravo era aceitável.  Um escravo tinha direito a bens pessoais e à propriedade.  Eram iguais em termos de pagamento de indenização pela sua morte.  Deviam ser ajudados a conquistar a liberdade legalmente se assim escolhessem, por meio de um mecanismo conhecido como mukataba e tadbeer.  Esse mecanismo está consagrado por Deus na escritura muçulmana em 24:33.

5.  O Islã fez da libertação de escravos um ato de adoração que agrada a Deus. 

Estabeleceu a libertação de escravos como expiação de pecados e para atos específicos de transgressão.  Os muçulmanos eram encorajados a libertar escravos espontaneamente, para se livrarem do tormento do Inferno.  O estado também era uma fonte de libertação de escravos, uma vez que a Lei Islâmica dita que o zakat - caridade obrigatória dada pelos muçulmanos ricos ao estado - devia ser gasto na libertação de escravos, entre outras coisas (Alcorão 9:60).

6. O Islã integrou os escravos na sociedade. 

A questão da integração dos escravos libertos na sociedade foi discutida por alguns estudiosos contemporâneos.  A solução islâmica foi integrá-los na sociedade tornando-os parte das tribos e famílias.  O sistema era conhecido como "wala." O Profeta do Islã disse: "Libertar escravos é como estabelecer relações de sangue."[8]

Algumas observações históricas

1.  Abul Ala Maududi escreve em seu trabalho "A Posição da Escravidão no Islã": "Só o profeta libertou 63 escravos.  O número de escravos libertados por Aisha foi 67, Abbas libertou 70, ‘Abd Allah ibn ‘Umar libertou mil e ‘Abd al-Rahman comprou trinta mil e os libertou."

2.  "Zaid, o liberto do profeta, era encarregado do comando de tropas e os capitães mais nobres serviram sob suas ordens sem vacilar; e seu filho Osama foi honrado com a liderança da expedição enviada por Abu Bakr contra os gregos.  Kutb ud-dîn, o primeiro rei de Délhi e o verdadeiro fundador do império muçulmano na Índia, era um escravo."[9]

3.  "Até escravos domésticos comuns eram mais bem alimentados, vestidos e protegidos do que muitos homens e mulheres livres."[10]

4.  "Toda a história do Islã prova que os escravos podiam ocupar qualquer posição e muitos ex-escravos militares, geralmente recrutados entre os turcos da Ásia central, se tornaram líderes militares e com frequência até governantes no Irã, Índia (a dinastia escrava de Délhi) e Egito medieval (os mamelucos)."[11]

5. "...a exclusividade da relação dono-escravo que tipifica os sistemas de escravidão nunca foi parte da realidade otomana.  O sistema jurídico baseado na Sharia rompeu essa exclusividade ao permitir que os escravos reclamassem de mau tratamento, o que podia levar à libertação forçada.  Embora, como vimos, os tribunais fossem relutantes em intervir nas relações dono-escravo e o estado fosse cuidadoso em não forçar os donos a libertar escravos involuntariamente, havia um mecanismo de intermediação disponível o tempo todo, capaz de interferir na relação, se necessário."[12]

6.  "Quanto aos escravos da Arábia Saudita, compartilhavam do mesmo alimento, roupas e casas com seus donos. Muitos deles se tornaram governantes de vastas regiões e foram ativos na administração do estado."[13]

7. "...abolição tardia da escravidão na Arábia Saudita.  A escravidão foi abolida na Arábia Saudita em 1962...isso porque a Arábia Saudita não existia como estado moderno antes de 1932, o que significa que levou trinta anos após sua criação para acabar com a escravidão e sem uma guerra civil."[14]



Notas de rodapé:

[1] Abu Daud, Musnad, Baihaqi

[2] Saheeh Al-Bukhari, Ibn Majah

[3] Saheeh Al-Bukhari

[4] Saheeh Muslim

[5] hadith registrado em Saheeh Muslim

[6] hadith registrado em Saheeh Muslim

[7] Annemarie Schimmel, Islam An Introduction (Albany, NY: State University of New York Press, 1992), 67

[8] Darimi

[9] Ameer Ali, The Spirit of Islam: A History of the Evolution and Ideals of Islam with a Life of the Prophet Revised ed., (Londres: Christophers, 1922), p.  264

[10] Ehud R.  Toledano, Slavery and Abolition in the Ottoman Middle East (Seattle: University of Washington Press, 1998), p.  6

[11] Annemarie Schimmel, Islam An Introduction (Albany, NY: State University of New York Press, 1992), 67

[12] Ehud R.  Toledano, Slavery and Abolition in the Ottoman Middle East (Seattle: University of Washington Press, 1998), p.  161-162

[13] Princesa Reem Al Faisal, Slavery in US and Other Places: The Vital Difference, publicado por www.arabview.com

[14] Princesa Reem Al Faisal, Slavery in US and Other Places: The Vital Difference, publicado por www.arabview.com

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